Não aceite ser quem você não é

Um dos maiores erros que já cometi foi este: Tentar ser o que não sou. Seja para agradar outros, para fazer parte de um grupo, ter acesso a alguma vantagem ou ser aceito, este erro é um verdadeiro “balázio no calcante“¹.

Na minha infância, as crianças tinham horário para dormir. Lá em casa, meus irmãos e eu dormíamos as 21 horas e 30 minutos. Havia sim alguns minutos de tolerância, que eram usados por nós três para assistir ao máximo de Chaves/Chapolin. Mas bastava minha mão iniciar a a contagem regressiva mortal (Uuuummm, Doooooiss…) que em questão de segundos estávamos deitados, com a bênção pedida e prontos para dormir. Certo dia, um super filme iria passar na Tela Quente. RoboCop 3 era algo “completamente novo” e era certo que absolutamente todos estariam comentando sobre este filmaço na terça pela manhã lá na escola. Meus irmãos e eu começamos então a negociação com meus primeiros “chefes”. Iniciamos mostrando aos nossos gestores que poderíamos alcançar as metas propostas (lavar a louça, varrer e arrumar a casa e deixar as lições de casa prontas) a tempo de termos esta vantagem, em contra partida, seria necessária uma mudança no cronograma que determinava a hora do soninho. Meu pai, o gestor mais maleável e receptivo declarou: “Vejam com sua mãe!”. Sabíamos que com ela teríamos que ser mais persuasivos. Pedimos, pedimos e pedimos. Mas após ela ver o trailer (propaganda) do filme, decidiu que era violento demais para gente e engavetou a proposta.

Ficamos sem ver o filme. Eu não estava disposto a admitir para meus amigos da escola quem mandava lá em casa eram meus pais. Na minha mente, era importante deixar claro que eu era independente e não tinha horário pra dormir, isso era coisa de criança e eu já tinha 10 anos! Decidi que iria dizer que tinha visto o filme. E fiz isso, menti pra mim mesmo e segui com a mentira para meus colegas. Falei durante algumas aulas sobre como o Robô era, o que ele fazia e contei até o final. Descobri que a maioria dos meus colegas não tinha visto o filme por que seus pais acharam muito violento, ao invés de parar eu segui. Contei o final incrível do filme e vi o brilho nos olhos de meus colegas enquanto eu descrevia como o policial cibernético voava pelos céus abanando para a tela. Agora eu era O CARA, o que tinha permissão para ver o que ninguém na sala da B via.

O problema de fingir ser algo que você não é, é criar uma versão de si mesmo que impede o crescimento verdadeiro. Ao viver uma vida irreal baseada no fingimento, a vida que é real atrofia e não evolui. Durante o restante do ano, eu vivi tendo que contar cada filme da Tela Quente. Eu sempre fui criativo, mas aquilo já estava ficando ridículo. Meus “fãs” começaram a perceber que cada filme ficava mais parecido com o anterior e que alguns filmes, quando contados na versão do Djeison, eram muito chatos. Graças a Deus fui desmascarado por meu irmão mais velho que me libertou da mentira durante um recreio quando interrompeu minha fala com um “pedala na gadânha” e a frase: “Para de mentir guri, tu não viu nada porque dorme cedo.”

Fiquei frustrado, meus colegas riram de mim. Por um momento eu tentei explicar à eles, mas decidi falar a verdade e dizer que minha mãe não deixava a gente ver filmes violentos e que passavam depois das 21h. Foi quando eu descobri que eles já sabiam de tudo. Alguns deles até viam os filmes de verdade e ficavam em silêncio, me escutando mentir, simplesmente por amizade.

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O pior é saber que, recentemente, repeti este comportamento infantil e auto destrutivo. Aceitei ir contra meus valores, contra aquilo que faz de mim quem eu sou, apenas por uma boa proposta de trabalho. Me uni a pessoas que não compartilhavam dos valores morais que movem meu mundo e colhi o fruto destas decisões. Projetos e relacionamentos que tem tudo para dar certo, darão errado se você não respeitar quem você é de verdade.

Sempre que você decidir agir contra seus valores fundamentais, sempre que você mentir para você para agradar outrem, o resultado será ruim. Mesmo que seja rentável.

Não aceite ser quem você não é. Você vai acabar fingindo ter o que não tem e vai acabar vivendo uma vida que não é a sua. No fim, ao invés de ser um super-herói real, você estará apenas assistindo a um filme sobre ele…ou pior, estará assistindo BBB.

Cada Dia é um Recomeço

Você aprendeu a “se alimentar” ainda na fase da infância. Sua mãe carinhosamente (ou não) lhe ensinou a usar os talheres e como obter um melhor desempenho para que a comida chegasse até sua boca. Então você aprendeu a como realizar esta tarefa. A tarefa vai ficando mais simples a cada dia, até que, sem notar, você virou um “expert” em usar os talheres para se alimentar. Mas, um dia, alguém surge e lhe apresenta uma comida diferente, Esta comida é estranha a primeira vista e você nota algo que parece arroz enrolado com algas e um salmão cortado. A sua frente um novo desafio, na verdade dois, experimentar a comida japonesa e usar hashi para isso. Neste momento, tudo o que você sabia sobre “como se alimentar” tem que ser repensado. Um novo desafio começa e você vai precisar recomeçar…e lá esta você aprendendo algo que achou que já sabia.

Sim, eu amo comer e não, não é sobre comida que estou querendo falar neste primeiro post. A analogia é pano de fundo para o que está acontecendo na vida de milhares de pessoas todos os dias.

O recomeço é algo que deveríamos estar acostumados mas não estamos. Nos condicionamos facilmente com coisas que nos fazem mal, que nos matam aos poucos, que nos deixam pra baixo e que nos tiram a motivação. Porque somos bons em reproduzirmos estes comportamentos tão prejudiciais a nossa vida?

Pare pra pensar em quanta coisa você ensinou seu cérebro a aceitar mesmo sabendo que lhe fará mal. Pode ser algum alimento que te prejudica, alguma bebida que você sabe que te tira o juízo, pode ser a falta de exercício físico ou um trabalho com um chefe agressivo e tolo, quem sabe seja um namorado que lhe trai a confiança ou ainda um hábito estúpido como fumar. Se algo assim é um hábito em sua vida, se algo assim ou equivalentes a estas situações são consideradas por você como “normais” então você precisa aceitar a ideia do recomeço.

Recomeçar dá muito trabalho. Muito mesmo. Eu canso toda a vez que penso em ir pra academia, tem gente que cansa quando pensa em estudar, ler um livro e até levantar da cama. Você já cansou só por pensar em levantar da cama? Eu já, e o que nos cansa quando estamos neste momento é o recomeço. Não o trabalho que ele dá, afinal nem iniciamos o esforço ainda, mas a ideia, a noção, o pensamento analítico do que nos espera, do que ainda virá.

Um grande mestre disse certa vez que “Como você pensa, assim o é.” (pode usar no Face essa) e eu concordo plenamente. Criamos “verdades absolutas” em nossa mente, baseadas em nossas culturas, criações e experiências, mas se existe algo que é absoluto neste mundo é a mudança. E se as coisas mudam, porque eu deveria permanecer sempre igual? Não seria inteligente que, de tempos em tempos, eu reiniciasse, recomeçasse? Não seria sábio se eu, quando notar algo que me prejudica, tentasse algo diferente daquilo? Seria sim. Seria sábio, inteligente e bom que, de tempos em tempos, decidíssemos recomeçar.

Alguns de nós, mesmo não querendo, são forçados a recomeçar. Forças externas, ocultas ou não, propiciam um ambiente em que a mudança é obrigatória e o recomeço necessário. Nestes casos, quando já não há mais opção de permanecer igual, o desafio do reinício pode criar uma série de sentimentos sequenciais como pânico, raiva, tristeza e aceitação.

Fica mais fácil entender estes estágio quando você se imagina digitando um grande trabalho, você ficou por horas buscando citações, corrigindo palavras, ajustando a formatação e, do nada, acaba a luz. É apenas uma piscada, porém, ao retornar a energia você percebe que não salvou o trabalho. Representando em imagens seria, mais ou menos, assim:

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Em geral, é assim que reagimos e, em geral, nós recomeçamos. Fazemos tudo novamente, do zero, e, novamente em geral, o trabalho que foi feito de novo fica melhor do que o anterior.

Não tenha medo de recomeçar. Não tenha medo de passar por cada uma das fases que a mudança, por decisão própria ou obrigatória, gera em seu ser. Viva cada momento, cada estágio, mas lembre-se: no final você precisa erguer a cabeça, arregaçar as mangas e recomeçar, afinal, o que você teve, fez ou foi não lhe pertencem mais, ficaram no tempo passado e na lembrança. Já o que você é, faz e conquista no HOJE, depende de quão rápido você aprende a recomeçar.

Recomece hoje. Com medo, com receio, sem preconceito, esquecendo os paradigmas. Recomece. Afinal, assim como comida japonesa com hashi é muito mais legal, a vida com recomeços é muito mais interessante.